Critérios Diagnósticos

  • Déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos, conforme manifestado pelo que segue, atualmente ou por história prévia (os exemplos são apenas ilustrativos, e não exaustivos; ver o texto):
  • Déficits na reciprocidade socioemocional, variando, por exemplo, de abordagem social anormal e dificuldade para estabelecer uma conversa normal a compartilhamento reduzido de interesses, emoções ou afeto, a dificuldade para iniciar ou responder a interações sociais.
  • Déficits nos comportamentos comunicativos não verbais usados para interação social, variando, por exemplo, de comunicação verbal e não verbal pouco integrada a anormalidade no contato visual e linguagem corporal ou déficits na compreensão e uso gestos, a ausência total de expressões faciais e comunicação não verbal.
  • Déficits para desenvolver, manter e compreender relacionamentos, variando, por exemplo, de dificuldade em ajustar o comportamento para se adequar a contextos sociais diversos a dificuldade em compartilhar brincadeiras imaginativas ou em fazer amigos, a ausência de interesse por pares.

Especificar a gravidade atual:

A gravidade baseia-se em prejuízos na comunicação social e em padrões de comportamento restritos e repetitivos (ver Tabela 2).

  1. Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades, conforme manifestado por pelo menos dois dos seguintes, atualmente ou por história prévia (os exemplos são apenas ilustrativos, e não exaustivos; ver o texto):
  1. Movimentos motores, uso de objetos ou fala estereotipados ou repetitivos (p. ex., estereotipias motoras simples, alinhar brinquedos ou girar objetos, ecolalia, frases idiossincráticas).
  2. Insistência nas mesmas coisas, adesão inflexível a rotinas ou padrões ritualizados de comportamento verbal ou não verbal (p. ex., sofrimento extremo em relação a pequenas mudanças, dificuldades com transições, padrões rígidos de pensamento, rituais de saudação, necessidade de fazer o mesmo caminho ou ingerir os mesmos alimentos diariamente).
  3. Interesses fixos e altamente restritos que são anormais em intensidade ou foco (p. ex., forte apego a ou preocupação com objetos incomuns, interesses excessivamente circunscritos ou perseverativos).
  4. Hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais ou interesse incomum por aspectos sensoriais do ambiente (p. ex., indiferença aparente a dor/temperatura, reação contrária a sons ou texturas específicas, cheirar ou tocar objetos de forma excessiva, fascinação visual por luzes ou movimento).

Especificar a gravidade atual:

A gravidade baseia-se em prejuízos na comunicação social e em padrões restritos ou repetitivos de comportamento (ver Tabela 2).

  1. Os sintomas devem estar presentes precocemente no período do desenvolvimento (mas podem não se tornar plenamente manifestos até que as demandas sociais excedam as capacidades limitadas ou podem ser mascarados por estratégias aprendidas mais tarde na vida).
  2. Os sintomas causam prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo no presente.
  3. Essas perturbações não são mais bem explicadas por deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual) ou por atraso global do desenvolvimento. Deficiência intelectual ou transtorno do espectro autista costumam ser comórbidos; para fazer o diagnóstico da comorbidade de transtorno do espectro autista e deficiência intelectual, a comunicação social deve estar abaixo do esperado para o nível geral do desenvolvimento.

Nota: Indivíduos com um diagnóstico do DSM-IV bem estabelecido de transtorno autista, transtorno de Asperger ou transtorno global do desenvolvimento sem outra especificação devem receber o diagnóstico de transtorno do espectro autista. Indivíduos com déficits acentuados na comunicação social, cujos sintomas, porém, não atendam, de outra forma, critérios de transtorno do espectro autista, devem ser avaliados em relação a transtorno da comunicação social (pragmática).

Especificar se:
Com ou sem comprometimento intelectual concomitante
Com ou sem comprometimento da linguagem concomitante
Associado a alguma condição médica ou genética conhecida ou a fator ambiental.

(Nota para codificação: Usar código adicional para identificar a condição médica ou genética associada.)

Associado a outro transtorno do neurodesenvolvimento, mental ou comportamental
(Nota para codificação: Usar código[s] adicional[is] para identificar o[s] transtorno[s] do neurodesenvolvimento, mental ou comportamental associado[s].)
Com catatonia (consultar os critérios para definição de catatonia associados a outro transtorno mental, p. 119-120) (Nota para codificação: usar o código adicional 293.89 [F06.1] de catatonia associada a transtorno do espectro autista para indicar a presença de catatonia comórbida.)

Procedimentos para Registro

No caso de transtorno do espectro autista associado a alguma condição médica ou genética conhecida ou a fator ambiental ou a outro transtorno do neurodesenvolvimento, mental ou comportamental, registrar o transtorno do espectro autista associado a (nome da condição, do transtorno ou do fator) (p. ex., transtorno do espectro autista associado à síndrome de Rett). A gravidade deve ser registrada como nível de apoio necessário a cada um dos dois domínios psicopatológicos da Tabela 2 (p. ex., “exigindo apoio muito substancial para déficits na comunicação social e exigindo apoio substancial para comportamentos restritos e repetitivos”). A especificação de “com comprometimento intelectual concomitante” ou “sem comprometimento intelectual concomitante” deve ser registrada em seguida. A especificação de comprometimento da linguagem deve ser registrada em seguida. Havendo comprometimento da linguagem concomitante, o nível atual do funcionamento verbal deve ser registrado (p. ex., “com comprometimento da linguagem concomitante – sem fala inteligível” ou “com comprometimento da linguagem concomitante – fala telegráfica”). Na presença de catatonia, registrar em separado “catatonia associada a transtorno do espectro autista”.

Especificadores

Os especificadores de gravidade (Tabela 2) podem ser usados para descrever, de maneira sucinta, a sintomatologia atual (que pode situar-se aquém do nível 1), com o reconhecimento de que a gravidade pode variar de acordo com o contexto ou oscilar com o tempo. A gravidade de dificuldades de comunicação social e de comportamentos restritos e repetitivos deve ser classificada em separado. As categorias descritivas de gravidade não devem ser usadas para determinar a escolha e a provisão de serviços; isso somente pode ser definido de forma individual e mediante a discussão de prioridades e metas pessoais. Em relação ao especificador “com ou sem comprometimento intelectual concomitante”, há necessidade de compreender o perfil intelectual (frequentemente irregular) de uma criança ou um adulto com transtorno do espectro autista para interpretar as características diagnósticas. São necessárias estimativas separadas das habilidades verbal e não verbal (p. ex., uso de testes não verbais sem cronometragem para avaliar potenciais pontos fortes em indivíduos com linguagem limitada). Para usar o especificador “com ou sem comprometimento da linguagem concomitante”, o nível atual de funcionamento verbal deve ser avaliado e descrito. Exemplos das descrições especí- ficas de “com comprometimento da linguagem concomitante” podem incluir ausência de fala inteligível (não verbal), apenas palavras isoladas ou fala telegráfica. O nível linguístico em pessoas “sem comprometimento da linguagem concomitante” pode ser descrito adicionalmente por fala em frases completas ou apresenta fala fluente. Uma vez que a linguagem receptiva pode se mostrar mais atrasada do que o desenvolvimento da linguagem expressiva, no transtorno do espectro autista as habilidades de linguagem receptiva e expressiva devem ser consideradas em separado.

O especificador “associado a alguma condição médica ou genética conhecida ou a fator ambiental” deve ser usado quando a pessoa tem alguma doença genética conhecida (p. ex., síndrome de Rett, síndrome do X-frágil, síndrome de Down), condição médica (p. ex., epilepsia) ou história de exposição ambiental (p. ex., ácido valproico, síndrome do álcool fetal, muito baixo peso ao nascer).

Outras condições do neurodesenvolvimento, mentais ou comportamentais também devem ser observadas (p. ex., transtorno de déficit de atenção/hiperatividade; transtorno do desenvolvimento da coordenação; transtornos do comportamento disruptivo, do controle de impulsos ou da conduta; transtornos de ansiedade, depressivo ou bipolar; transtorno de tique ou de Tourette; autolesão; alimentares, da eliminação ou do sono).

TABELA 2 Níveis de gravidade para transtorno do espectro autista:

Nível de gravidade

Nível 3: “Exigindo apoio muito substancial”
Comunicação social.
Déficits graves nas habilidades de comunicação social verbal e não verbal causam prejuízos graves de funcionamento, grande limitação em dar início a interações sociais e resposta mínima a aberturas sociais que partem de outros. Por exemplo, uma pessoa com fala inteligível de poucas palavras que raramente inicia as interações e, quando o faz, tem abordagens incomuns apenas para satisfazer a necessidades e reage somente a abordagens sociais muito diretas.
Comportamentos restritos e repetitivos. Inflexibilidade de comportamento, extrema dificuldade em lidar com a mudança ou outros comportamentos restritos/repetitivos interferem acentuadamente no funcionamento em todas as esferas. Grande sofrimento/dificuldade para mudar o foco ou as ações.

Nível 2: “Exigindo apoio substancial”
Comunicação social. Déficits graves nas habilidades de comunicação social verbal e não verbal; prejuízos sociais aparentes mesmo na presença de apoio; limitação em dar início a interações sociais e res- posta reduzida ou anormal a aberturas sociais que partem de outros. Por exemplo, uma pessoa que fala frases simples, cuja interação se limita a interesses especiais reduzidos e que apresenta comunicação não verbal acentuadamente estranha.
Comportamentos restritos e repetitivos. Inflexibilidade do comportamento, dificuldade de lidar com a mudança ou outros comportamentos restritos/repetitivos aparecem com frequência suficiente para serem óbvios ao observador casual e interferem no funcionamento em uma variedade de contextos. Sofrimento e/ou dificuldade de mudar o foco ou as ações.

Nível 1: “Exigindo apoio”
Comunicação social. Na ausência de apoio, déficits na comunicação social causam prejuízos notáveis. Dificuldade para iniciar interações sociais e exemplos claros de respostas atípicas ou sem sucesso a aberturas sociais dos outros. Pode parecer apresentar interesse reduzido por interações sociais. Por exemplo, uma pessoa que consegue falar frases completas e envolver-se na comunicação, embora apresente falhas na conversação com os outros e cujas tentativas de fazer amizades são estranhas e comumente malsucedidas.
Comportamentos restritos e repetitivos. Inflexibilidade de comportamento causa interferência significativa no funcionamento em um ou mais contextos. Dificuldade em trocar de atividade. Problemas para organização e planejamento são obstáculos à independência.

Características Diagnósticas

As características essenciais do transtorno do espectro autista são prejuízo persistente na comunicação social recíproca e na interação social (Critério A) e padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades (Critério B). Esses sintomas estão presentes desde o início da infância e limitam ou prejudicam o funcionamento diário (Critérios C e D). O estágio em que o prejuízo funcional fica evidente irá variar de acordo com características do indivíduo e seu ambiente. Características diagnósticas nucleares estão evidentes no período do desenvolvimento, mas intervenções, compensações e apoio atual podem mascarar as dificuldades, pelo menos em alguns contextos. Manifestações do transtorno também variam muito dependendo da gravidade da condição autista, do nível de desenvolvimento e da idade cronológica; daí o uso do termo espectro. O transtorno do espectro autista engloba transtornos antes chamados de autismo infantil precoce, autismo infantil, autismo de Kanner, autismo de alto funcionamento, autismo atípico, transtorno global do desenvolvimento sem outra especificação, transtorno desintegrativo da infância e transtorno de Asperger.

Os prejuízos na comunicação e na interação social especificados no Critério A são pervasivos e sustentados. Os diagnósticos são mais válidos e confiáveis quando baseados em múltiplas fontes de informação, incluindo observações do clínico, história do cuidador e, quando possível, autorrelato. Déficits verbais e não verbais na comunicação social têm manifestações variadas, dependendo da idade, do nível intelectual e da capacidade linguística do indivíduo, bem como de outros fatores, como história de tratamento e apoio atual. Muitos indivíduos têm déficits de linguagem, as quais variam de ausência total da fala, passando por atrasos na linguagem, compreensão reduzida da fala, fala em eco até linguagem explicitamente literal ou afetada. Mesmo quando habilidades linguísticas formais (p. ex., vocabulário, gramática) estão intactas, o uso da linguagem para comunicação social recíproca está prejudicado no transtorno do espectro autista.

Déficits na reciprocidade socioemocional (i.e., capacidade de envolvimento com outros e compartilhamento de ideias e sentimentos) estão claramente evidentes em crianças pequenas com o transtorno, que podem apresentar pequena ou nenhuma capacidade de iniciar interações sociais e de compartilhar emoções, além de imitação reduzida ou ausente do comportamento de outros. Havendo linguagem, costuma ser unilateral, sem reciprocidade social, usada mais para solicitar ou rotular do que para comentar, compartilhar sentimentos ou conversar. Nos adultos sem deficiência intelectual ou atrasos de linguagem, os déficits na reciprocidade socioemocional podem aparecer mais em dificuldades de processamento e resposta a pistas sociais complexas (p. ex., quando e como entrar em uma conversa, o que não dizer). Adultos que desenvolveram estratégias compensatórias para alguns desafios sociais ainda enfrentam dificuldades em situações novas ou sem apoio, sofrendo com o esforço e a ansiedade para, de forma consciente, calcular o que é socialmente intuitivo para a maioria dos indivíduos.

Déficits em comportamentos de comunicação não verbal usados para interações sociais são expressos por uso reduzido, ausente ou atípico de contato visual (relativo a normas culturais), gestos, expressões faciais, orientação corporal ou entonação da fala. Um aspecto precoce do transtorno do espectro autista é a atenção compartilhada prejudicada, conforme manifestado por falta do gesto de apontar, mostrar ou trazer objetos para compartilhar o interesse com outros ou dificuldade para seguir o gesto de apontar ou o olhar indicador de outras pessoas. Os indivíduos podem aprender alguns poucos gestos funcionais, mas seu repertório é menor do que o de outros e costumam fracassar no uso de gestos expressivos com espontaneidade na comunicação. Entre adultos com linguagem fluente, a dificuldade para coordenar a comunicação não verbal com a fala pode passar a impressão de “linguagem corporal” estranha, rígida ou exagerada durante as interações. O prejuízo pode ser relativamente sutil em áreas individuais (p. ex., alguém pode ter contato visual relativamente bom ao falar), mas perceptível na integração insatisfatória entre contato visual, gestos, postura corporal, prosódia e expressão facial para a comunicação social.

Déficits para desenvolver, manter e compreender as relações devem ser julgados em relação aos padrões relativos a idade, gênero e cultura. Pode haver interesse social ausente, reduzido ou atípico, manifestado por rejeição de outros, passividade ou abordagens inadequadas que pareçam agressivas ou disruptivas. Essas dificuldades são particularmente evidentes em crianças pequenas, em quem costuma existir uma falta de jogo social e imaginação compartilhados (p. ex., brincar de fingir de forma flexível e adequada à idade) e, posteriormente, insistência em brincar seguindo regras muito fixas. Indivíduos mais velhos podem relutar para entender qual o comportamento considerado apropriado em uma situação e não em outra (p. ex., comportamento casual durante uma entrevista de emprego) ou as diversas formas de uso da linguagem para a comunicação (p. ex., ironia, mentirinhas). Pode existir aparente preferência por atividades solitárias ou por interações com pessoas muito mais jovens ou mais velhas. Com frequência, há desejo de estabelecer amizades sem uma ideia completa ou realista do que isso significa (p. ex., amizades unilaterais ou baseadas unicamente em interesses especiais compartilhados). Também é importante considerar o relacionamento com irmãos, colegas de trabalho e cuidadores (em termos de reciprocidade).

O transtorno do espectro autista também é definido por padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades (conforme especificado no Critério B) que mostram uma gama de manifestações de acordo com a idade e a capacidade, intervenções e apoios atuais. Comportamentos estereotipados ou repetitivos incluem estereotipias motoras simples (p. ex., abanar as mãos, estalar os dedos), uso repetitivo de objetos (p. ex., girar moedas, enfileirar objetos) e fala repetitiva (p. ex., ecolalia, repetição atrasada ou imediata de palavras ouvidas, uso de “tu” ao referir-se a si mesmo, uso estereotipado de palavras, frases ou padrões de prosódia). Adesão excessiva a rotinas e padrões restritos de comportamento podem ser manifestados por resistência a mudanças (p. ex., sofrimento relativo a mudanças aparentemente pequenas, como embalagem de um alimento favorito; insistência em aderir a regras; rigidez de pensamento) ou por padrões ritualizados de comportamento verbal ou não verbal (p. ex., perguntas repetitivas, percorrer um perímetro). Interesses altamente limitados e fixos, no transtorno do espectro autista, tendem a ser anormais em intensidade ou foco (p. ex., criança pequena muito apegada a uma panela; criança preocupada com aspiradores de pó; adulto que gasta horas escrevendo tabelas com horário). Alguns encantamentos e rotinas podem estar relacionados a uma aparente hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais, manifestada por meio de respostas extremadas a sons e texturas especí- ficos, cheirar ou tocar objetos de forma excessiva, encantamento por luzes ou objetos giratórios e, algumas vezes, aparente indiferença a dor, calor ou frio. Reações extremas ou rituais envolvendo gosto, cheiro, textura ou aparência da comida ou excesso de restrições alimentares são comuns, podendo constituir a forma de apresentação do transtorno do espectro autista.

Muitos adultos com transtorno do espectro autista sem deficiência intelectual ou linguística aprendem a suprimir comportamentos repetitivos em público. Interesses especiais podem constituir fonte de prazer e motivação, propiciando vias de educação e emprego mais tarde na vida. Os critérios diagnósticos podem ser satisfeitos quando padrões limitados e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades estiverem claramente presentes na infância ou em algum momento do passado mesmo que os sintomas não estejam mais presentes.

O Critério D exige que as características devam ocasionar prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo no presente. O Critério E especifica que os déficits de comunicação social, ainda que algumas vezes acompanhados por deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual), não estão alinhados com o nível de desenvolvimento individual e que os prejuízos excedem as dificuldades esperadas com base no nível do desenvolvimento.

Instrumentos padronizados de diagnóstico do comportamento, com boas propriedades psicométricas, incluindo entrevistas com cuidadores, questionários e medidas de observação clínica, estão disponíveis e podem aumentar a confiabilidade do diagnóstico ao longo do tempo e entre clínicos.

Características Associadas que Apoiam o Diagnóstico

Muitos indivíduos com transtorno do espectro autista também apresentam comprometimento intelectual e/ou da linguagem (p. ex., atraso na fala, compreensão da linguagem aquém da produção). Mesmo aqueles com inteligência média ou alta apresentam um perfil irregular de capacidades. A discrepância entre habilidades funcionais adaptativas e intelectuais costuma ser grande. Déficits motores estão frequentemente presentes, incluindo marcha atípica, falta de coordenação e outros sinais motores anormais (p. ex., caminhar na ponta dos pés). Pode ocorrer autolesão (p. ex., bater a cabeça, morder o punho), e comportamentos disruptivos/desafiadores são mais comuns em crianças e adolescentes com transtorno do espectro autista do que em outros transtornos, incluindo deficiência intelectual. Adolescentes e adultos com transtorno do espectro autista são propensos a ansiedade e depressão. Alguns indivíduos desenvolvem comportamento motor semelhante à catatonia (lentificação e “congelamento” em meio a ação), embora isso tipicamente não costume alcançar a magnitude de um episódio catatônico. É possível, porém, que indivíduos com transtorno do espectro autista apresentem deterioração acentuada em sintomas motores e um episódio catatônico completo com sintomas como mutismo, posturas atípicas, trejeitos faciais e flexibilidade cérea. O período de risco de catatonia comórbida parece ser maior nos anos de adolescência.

Prevalência

Em anos recentes, as frequências relatadas de transtorno do espectro autista, nos Estados Unidos e em outros países, alcançaram 1% da população, com estimativas similares em amostras de crianças e adultos. Ainda não está claro se taxas mais altas refletem expansão dos critérios diagnósticos do DSM-IV de modo a incluir casos sublimiares, maior conscientização, diferenças na metodologia dos estudos ou aumento real na frequência do transtorno.

Desenvolvimento e Curso

A idade e o padrão de início também devem ser observados para o transtorno do espectro autista. Os sintomas costumam ser reconhecidos durante o segundo ano de vida (12 a 24 meses), embora possam ser vistos antes dos 12 meses de idade, se os atrasos do desenvolvimento forem graves, ou percebidos após os 24 meses, se os sintomas forem mais sutis. A descrição do padrão de início pode incluir informações sobre atrasos precoces do desenvolvimento ou quaisquer perdas de habilidades sociais ou linguísticas. Nos casos em que houve perda de habilidades, pais ou cuidadores podem relatar história de deterioração gradual ou relativamente rápida em comportamentos sociais ou nas habilidades linguísticas. Em geral, isso ocorre entre 12 e 24 meses de idade, sendo distinguível dos raros casos de regressão do desenvolvimento que ocorrem após pelo menos 2 anos de desenvolvimento normal (anteriormente descrito como transtorno desintegrativo da infância).

As características comportamentais do transtorno do espectro autista tornam-se inicialmente evidentes na primeira infância, com alguns casos apresentando falta de interesse em interações sociais no primeiro ano de vida. Algumas crianças com transtorno do espectro autista apresentam platôs ou regressão no desenvolvimento, com uma deterioração gradual ou relativamente rápida em comportamentos sociais ou uso da linguagem, frequentemente durante os dois primeiros anos de vida. Tais perdas são raras em outros transtornos, podendo ser um sinal de alerta útil para o transtorno do espectro autista. Muito mais incomuns e merecedoras de investigação médica ampla são perdas de habilidades além da comunicação social (p. ex., perda do autocuidado, do controle de esfincteres, de habilidades motoras) ou as que ocorrem após o segundo aniversário (ver também síndrome de Rett, na seção “Diagnóstico Diferencial” para esse transtorno).

Os primeiros sintomas do transtorno do espectro autista frequentemente envolvem atraso no desenvolvimento da linguagem, em geral acompanhado por ausência de interesse social ou interações sociais incomuns (p. ex., puxar as pessoas pela mão sem nenhuma tentativa de olhar para elas) padrões estranhos de brincadeiras (p. ex., carregar brinquedos, mas nunca brincar com eles), e padrões incomuns de comunicação (p. ex., conhecer o alfabeto, mas não responder ao próprio nome). Um diagnóstico de surdez é geralmente considerado, mas costuma ser descartado. Durante o segundo ano, comportamentos estranhos e repetitivos e ausência de brincadeiras típicas tornam-se mais evidentes. Uma vez que muitas crianças pequenas com desenvolvimento normal têm fortes preferências e gostam de repetição (p. ex., ingerir os mesmos alimentos, assistir muitas vezes ao mesmo filme), em pré-escolares pode ser difícil distinguir padrões restritos e repetitivos de comportamentos diagnósticos do transtorno do espectro autista. A distinção clínica baseia-se no tipo, na frequência e na intensidade do comportamento (p. ex., uma criança que diariamente alinha os objetos durante horas e sofre bastante quando algum deles é movimentado).

O transtorno do espectro autista não é um transtorno degenerativo, sendo comum que aprendizagem e compensação continuem ao longo da vida. Os sintomas são frequentemente mais acentuados na primeira infância e nos primeiros anos da vida escolar, com ganhos no desenvolvimento sendo frequentes no fim da infância pelo menos em certas áreas (p. ex., aumento no interesse por interações sociais). Uma pequena proporção de indivíduos apresenta deterioração comportamental na adolescência, enquanto a maioria dos outros melhora. Apenas uma minoria de indivíduos com transtorno do espectro autista vive e trabalha de forma independente na fase adulta; aqueles que o fazem tendem a ter linguagem e capacidades intelectuais superiores, conseguindo encontrar um nicho que combine com seus interesses e habilidades especiais. Em geral, indivíduos com ní- veis de prejuízo menores podem ser mais capazes de funcionar com independência. Mesmo esses indivíduos, no entanto, podem continuar socialmente ingênuos e vulneráveis, com dificuldades para organizar as demandas práticas sem ajuda, mais propensos a ansiedade e depressão. Muitos adultos informam usar estratégias compensatórias e mecanismos de enfrentamento para mascarar suas dificuldades em público, mas sofrem com o estresse e os esforços para manter uma fachada socialmente aceitável. Quase nada se sabe sobre a fase da velhice no transtorno do espectro autista.

Alguns indivíduos aparecem pela primeira vez para o diagnóstico na idade adulta, talvez levados pelo diagnóstico de autismo em alguma criança da família ou pelo rompimento de relações profissionais ou familiares. Pode ser difícil, nesses casos, obter uma história detalhada do desenvolvimento, sendo importante levar em conta as dificuldades autorrelatadas. Quando a observação clínica sugerir que os critérios são preenchidos no presente, pode ser diagnosticado o transtorno do espectro autista, desde que não haja evidências de boas habilidades sociais e de comunicação na infância. Por exemplo, o relato (de pais ou outro familiar) de que a pessoa teve amizades recíprocas normais e permanentes e boas habilidades não verbais durante a infância descartaria um diagnóstico de transtorno do espectro autista; a ausência de informações sobre o desenvolvimento, por si só, porém, não deve cumprir esse papel.

Manifestações de prejuízos sociais e de comunicação e comportamentos restritos/repetitivos que definam o transtorno do espectro autista são claras no período do desenvolvimento. Mais tarde, intervenção e compensação, além dos apoios atuais, podem mascarar essas dificuldades pelo menos em alguns contextos. Os sintomas, entretanto, permanecem suficientes para causar prejuízo atual no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.

Fatores de Risco e Prognóstico

Os melhores fatores prognósticos estabelecidos para as evoluções individuais no transtorno do espectro autista são presença ou ausência de deficiência intelectual e comprometimento da linguagem associados (p. ex., linguagem funcional por volta dos 5 anos de idade é um sinal de bom prognóstico), bem como outros problemas de saúde mental. Epilepsia, como um diagnóstico de comorbidade, está associada a maior deficiência intelectual e menor capacidade verbal.

Ambientais. Uma gama de fatores de risco inespecíficos, como idade parental avançada, baixo peso ao nascer ou exposição fetal a ácido valproico, pode contribuir para o risco de transtorno do espectro autista.

Genéticos e fisiológicos. Estimativas de herdabilidade para o transtorno do espectro autista variam de 37% até mais de 90%, com base em taxas de concordância entre gêmeos. Atualmente, até 15% dos casos de transtorno do espectro autista parecem estar associados a uma mutação genética conhecida, com diferentes variações no número de cópias de novo ou mutações de novo em genes específicos associados ao transtorno em diferentes famílias. No entanto, mesmo quando um transtorno do espectro autista está associado a uma mutação genética conhecida, não parece haver penetrância completa. O risco para o restante dos casos parece ser poligênico, possivelmente com centenas de loci genéticos fazendo contribuições relativamente pequenas.

Questões Diagnósticas Relativas à Cultura

Haverá diferenças culturais nas normas de interação social, comunicação não verbal e relacionamentos; indivíduos com transtorno do espectro autista, entretanto, apresentam prejuízos marcados em relação aos padrões de seu contexto cultural. Fatores culturais e socioeconômicos podem influenciar a idade de identificação ou de diagnóstico; por exemplo, nos Estados Unidos, pode ocorrer diagnóstico tardio ou subdiagnóstico de transtorno do espectro autista entre crianças afro-americanas.

Questões Diagnósticas Relativas ao Gênero

O transtorno do espectro autista é diagnosticado quatro vezes mais frequentemente no sexo masculino do que no feminino. Em amostras clínicas, pessoas do sexo feminino têm mais propensão a apresentar deficiência intelectual concomitante, sugerindo que meninas sem comprometimento intelectual concomitante ou atrasos da linguagem podem não ter o transtorno identificado, talvez devido à manifestação mais sutil das dificuldades sociais e de comunicação.

Consequências Funcionais do Transtorno do Espectro Autista

Em crianças pequenas com transtorno do espectro autista, a ausência de capacidades sociais e comunicacionais pode ser um impedimento à aprendizagem, especialmente à aprendizagem por meio da interação social ou em contextos com seus colegas. Em casa, a insistência em rotinas e a aversão à mudança, bem como sensibilidades sensoriais, podem interferir na alimentação e no sono e tornar os cuidados de rotina extremamente difíceis (p. ex., cortes de cabelo, cuidados dentários). As capacidades adaptativas costumam estar abaixo do QI medido. Dificuldades extremas para planejar, organizar e enfrentar a mudança causam impacto negativo no sucesso acadêmico, mesmo para alunos com inteligência acima da média. Na vida adulta, esses indivíduos podem ter dificuldades de estabelecer sua independência devido à rigidez e à dificuldade contínuas com o novo.

Muitos indivíduos com transtorno do espectro autista, mesmo sem deficiência intelectual, têm funcionamento psicossocial insatisfatório na idade adulta, conforme avaliado por indicadores como vida independente e emprego remunerado. As consequências funcionais no envelhecimento são desconhecidas; isolamento social e problemas de comunicação (p. ex., redução da busca por ajuda) provavelmente têm consequências para a saúde na velhice.

Diagnóstico Diferencial

Síndrome de Rett. Uma ruptura da interação social pode ser observada durante a fase regressiva da síndrome de Rett (em geral, entre 1 e 4 anos de idade); assim, uma proporção substancial das meninas afetadas pode ter uma apresentação que preenche critérios diagnósticos para transtorno do espectro autista. Depois desse período, no entanto, a maioria dos indivíduos com síndrome de Rett melhora as habilidades de comunicação social, e as características autistas não são mais grande foco de preocupação. Consequentemente, o transtorno do espectro autista somente deve ser considerado quando preenchidos todos os critérios diagnósticos.
Mutismo seletivo. No mutismo seletivo, o desenvolvimento precoce não costuma ser acometido. A criança afetada normalmente exibe habilidades comunicacionais apropriadas em alguns contextos e locais. Mesmo nos contextos em que a criança é muda, a reciprocidade social não se mostra prejudicada, nem estão presentes padrões de comportamento restritivos ou repetitivos.
Transtornos da linguagem e transtorno da comunicação social (pragmática). Em algumas formas de transtorno da linguagem, pode haver problemas de comunicação e algumas dificuldades sociais secundárias. O transtorno específico da linguagem, porém, não costuma estar associado a comunicação não verbal anormal nem à presença de padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades.
Quando um indivíduo apresenta prejuízo na comunicação social e nas interações sociais, mas não exibe comportamentos ou interesses restritos ou repetitivos, podem ser preenchidos critérios para transtorno da comunicação social (pragmática) em vez de transtorno do espectro autista. O diagnóstico de transtorno do espectro autista se sobrepõe ao de transtorno da comunica- ção social (pragmática) sempre que preenchidos os critérios para transtorno do espectro autista, devendo-se indagar cuidadosamente sobre comportamento restrito/repetitivo anterior ou atual.
Deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual) sem transtorno do espectro autista. Pode ser difícil diferenciar deficiência intelectual sem transtorno do espectro autista de transtorno do espectro autista em crianças muito jovens. Indivíduos com deficiência intelectual que não desenvolveram habilidades linguísticas ou simbólicas também representam um desafio para o diagnóstico diferencial, uma vez que comportamentos repetitivos frequentemente também ocorrem em tais indivíduos. Um diagnóstico de transtorno do espectro autista em uma pessoa com deficiência intelectual é adequado quando a comunicação e a interação sociais estão significativamente prejudicadas em relação ao nível de desenvolvimento de suas habilidades não verbais (p. ex., habilidades motoras finas, solução de problemas não verbais). Diferentemente, a deficiência intelectual é o diagnóstico apropriado quando não há discrepância aparente entre o nível das habilidades de comunicação social e outras habilidades intelectuais.
Transtorno do movimento estereotipado. Estereotipias motoras estão entre as características diagnósticas do transtorno do espectro autista, de modo que um diagnóstico adicional de transtorno do movimento estereotipado não é feito quando tais comportamentos repetitivos são mais bem explicados pela presença do transtorno do espectro autista. Quando as estereotipias causam autolesão e se tornam um foco do tratamento, os dois diagnósticos podem ser apropriados.
Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade. Anormalidades de atenção (foco exagerado ou distração fácil) são comuns em pessoas com transtorno do espectro autista, assim como o é a hiperatividade. Um diagnóstico de transtorno de déficit de atenção/hiperatividade deve ser considerado quando dificuldades atencionais ou hiperatividade excedem o tipicamente encontrado em indivíduos de idade mental comparável.
Esquizofrenia. Esquizofrenia com início na infância costuma desenvolver-se após um período de desenvolvimento normal ou quase normal. Há descrição de um estado prodrômico no qual ocorrem prejuízo social, interesses e crenças atípicos que podem ser confundidos com os déficits sociais encontrados no transtorno do espectro autista. Alucinações e delírios, características definidoras da esquizofrenia, não são elementos do transtorno do espectro autista. Os clínicos, entretanto, devem levar em conta que indivíduos com transtorno do espectro autista podem ser concretos na interpretação de perguntas sobre aspectos-chave da esquizofrenia (p. ex., “Você ouve vozes quando não há ninguém por perto?” “Sim [no rádio]”).

Comorbidade

O transtorno do espectro autista é frequentemente associado com comprometimento intelectual e transtorno estrutural da linguagem (i.e., incapacidade de compreender e construir frases gramaticalmente corretas), que devem ser registrados conforme os especificadores relevantes quando aplicáveis. Muitos indivíduos com transtorno do espectro autista apresentam sintomas psiquiá- tricos que não fazem parte dos critérios diagnósticos para o transtorno (cerca de 70% das pessoas com transtorno do espectro autista podem ter um transtorno mental comórbido, e 40% podem ter dois ou mais transtornos mentais comórbidos). Quando critérios tanto para TDAH quanto para transtorno do espectro autista são preenchidos, ambos os diagnósticos devem ser dados. O mesmo princípio aplica-se a diagnósticos concomitantes de transtorno do espectro autista e transtorno do desenvolvimento da coordenação, transtornos de ansiedade, transtornos depressivos e outros diagnósticos de comorbidade. Entre indivíduos que não falam ou têm déficits de linguagem, sinais observáveis, como mudanças no sono ou na alimentação e aumento no comportamento desafiante, devem desencadear uma avaliação para ansiedade ou depressão. Dificuldades específicas de aprendizagem (leitura, escrita e aritmética) são comuns, assim como o transtorno do desenvolvimento da coordenação. As condições médicas normalmente associadas ao transtorno do espectro autista devem ser registradas no especificador “condição médica ou genética conhecida ou a fator ambiental”. Tais condições médicas incluem epilepsia, distúrbios do sono e constipação. Transtorno alimentar restritivo/evitativo é uma característica que se apresenta com bastante frequência no transtorno do espectro autista, e preferências alimentares extremas e reduzidas podem persistir.

(Fonte: DSM-5)
O texto acima possui caráter exclusivamente informativo. Jamais empreenda qualquer tipo de tratamento ou se automedique sem a orientação de um especialista.

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